A atuação de Hitler como o pior dos demônios ao vivo da humanidade não pode ter qualquer justificativa. Mas, confesso que durante toda a minha vida adulta jamais fui capaz de entender ter sido ele eleito e reeleito pelo povo alemão.
Não só ele. Mussolini, na Itália e Hirohito, imperador do Japão estavam em seus postos legalmente. Não eram usurpadores.
O que isto pode nos ensinar, o que isto pode nos levar a pensar...
Durante toda a minha vida - iniciada quando estávamos na Segunda Guerra Mundial - os nazistas, os fascistas e os imperialistas japoneses me intrigaram.
Não quando eu era um menino "integrado" nas forças aliadas com a sanha de acabar com eles todos. Meu pai era do Exército e estava servindo em Recife - uma zona de guerra sobrevoada por Fortalezas Voadoras que saiam de Natal para bombardear a África e por vezes voltavam para Recife.
A guerra era também minha representada por meus brinquedos - tanques, aviões, canhões com os quais eu acabava com todos os inimigos do eixo.
Os fatos, descontada a guerra, era que Alemanha, Itália e Japão, embora integrados num Eixo do Mal, tinham sido e eram participantes ativas na evolução da humanidade.
Seu povos não constituíam uma organização criminosa e odienta decidida, por seus estatutos demoníacos não escritos, a ferrarem o mundo.
Nas histórias em quadrinhos houve umm personagem com estas características demoníacas - o dr Silvana - que deve ter sido criado para representar como agem as forças do mal quando são deixadas soltas e no caso dele, sem o capitão Marvel disposto a acabar com as suas articulações...
A Segunda Guerra Mundial, depois de matar uns 60 milhões de pessoas, terminou como todos sabemos: Hitler se matando com Eva Braun em seu bunker, Mussolini pendurado de cabeça para baixo ao lado de Clara Petacci, sua amante numa praça de Milão e com Hiroito, continuando imperador do sol nascente no Japão, mas sob a nova administração de MacArthur, até as coisas se tornarem mais confiáveis.
Mussolini e Hiroito foram drs Silvanas de segunda linha. Mas Hitler tornou-se o pior vilão da história da humanidade.
Na mesma ocasião na URSS, o georgiano Stálin, independente dos combates contra o seu aliado inicial Hitler e depois seu inimigo, promoveu a prisão de milhões de habitantes de seu país e a morte de pelo menos 20 milhões deles por fuzilamento ou em campos de trabalho forçado na Sibéria.
Stálin foi outra demonstração viva da existência do demônio, mas não chegou aos pés do Adolfo austríaco que foi o fuherer - condutor - da Alemanha de 1930 até 1945.
Por uma notável coincidência um pouco antes e após a libertação dos escravos em 1888 o Brasil gigantesco, (como os EUA, Argentina e outros países com muitas terras ) receberam navios e mais navios de estrangeiros cujo futuro não lhes parecia promissor em seus países.
No Brasil, além de portugueses , que fizeram o "achamento" do país, como o definiu Pero Vaz Caminha, recebemos grandes grupos de alemães, italianos e japoneses.
Em Santa Catarina havia tantos deles que a língua falada nas ruas poderia ser alemão ou italiano, em dialetos , ou portugues também em dialeto.
Antes de meu nascimento, meu pai e minha mãe moraram em Brusque em SC, quando meu pai tinha a missão militar de integrar os jovens"germânicos" em nosso exército durante o serviço militar. Muitos dos jovens "catarinas" vieram servir o exército no Rio de Janeiro e eram maioria no Batalhão da Polícia do Exército.
Não sei, nem estudei, se esta integração forçada num ambiente carioca promoveu a ruptura étnica dos catarinas com as suas origens paroquiais. Mas, para o bem da população brasileira praticamente não existem hoje grupos étnicos radicais no país.
Há neo-nazistas aqui e ali que aparentemente curtem mais se encherem de tatuagens "sinistras" e a posarem de maus do que se dedicarem a estudos e planos mais profundos das bases do nazismo.Desconfio que nos dias atuais todo grupo radical seja integrado por "analfabetos funcionais" a que acrescento "Graças a Deus!!"
Hoje temos no Brasil milhões de brasileiros com sobrenomes em que se integram origens italianas, com alemães, japonesas , portuguesas, indígenas sem maiores traumas.
Mas durante a Guerra a coisa era bem diferente. O chopp e os tira gostos, as saladas de batatas, o einsbein, as linguiças eram parte principal da alimentação e bebericação dos boemios brasileiros e em especial dos cariocas.
Com Hitler se chamando Adolfo imagine a impossibilidade moral - por mais elástica que fosse ela - de um cara ir se divertir no Bar Adolfo? Não dava, mas a sede e o apetite continuava e antes do quebra-quebra cívico o Bar Adolfo virou Bar Luiz, como se abrasileiraram todos os outros bares da mesma estirpe.
Na minha casa vivemos a saia justa das saias justas. Minha mãe tinha duas irmãs mais próximas, filhas do mesmo pai, o Dr. Getúlio desembargador e já falecido ex-presidente do Tribunal de Justiça do Espírito Santo e da mesma mãe , D. Ermelinda nascida na fazenda de seu pai em São Mateus.
Gilda e Glycia eram casadas com oficiais do exército e Guiomar era casada com um alemão, tio Bruno que havia chegado ao Espírito Santo como comprador de café para empresas alemãs no início da década de 30.
Tio Bruno, antes do meu nascimento, foi o introdutor dos hábitos alimentares alemães na família. Mas à medida que Hitler e o nazismo demonstravam a sua eficiência na Alemanha a coisa aqui também se complicou no ambiente familiar.
Meu tio Carlos, o Cacá, como engenheiro do Exército, morou na Alemanha um ano por volta de 1938 em missão oficial de buscar know how para abrir uma fábrica de máscaras contra gases para o exército em Bonsucesso, no Rio.
Tanto ele como Tia Glycia - a Ciá - voltaram da Alemanha falando alemão e vim a saber depois de crescido com a certeza de que Hitler estava pronto para ir à Guerra.
Mas, a Alemanha como todo estava um brinco. Estradas primorosas, juventude disciplinada, fervor patriótico, os parentes de Tio Bruno com empresas muito bem sucedidas, e um rancor profundo contra os traidores que haviam assinado a rendição em 1918 e as cláusulas das reparações pela Grande Guerra.
No Brasil, como devia acontecer com grande parte dos alemães e seus descendentes havia uma profunda admiração pela administração que tornava o seu país tão humilhado pela derrota em 1918 novamente tão admirável.
Estou me referindo a estes acontecimentos com a perspectiva familiar para tornar estes fatos tão distantes mais reais para quem os lê, aqui
Mas, o rancor dos nazistas era muito mais intenso do que um jogo de cena. Eles queriam a vingança para implantar o reich dos 1000 anos.
Hitler, falou as palavras mais doces para um povo que já havia se
sentido o superior, e tinha sido reduzido em sua importância da forma mais drástica.
E conseguiu que este povo fardado e sem farda cumprisse as suas determinações acrescentando sempre um "Heil Hitler", a tudo o que diziam com ênfase.
Hitler, Mussolini e Hirohito foram os grandes culpados de tudo e, embora durante a guerra, os alemães, italianos e japoneses fossem para nós os grandes inimigos , depois da Guerra muito rapidamente estes três povos perderam este ar demoníaco.
E o que é mais estranho ainda: a Alemanha, a Itália e o Japão nos próximos 40 ou 50 anos tiveram grande sucesso. Mais sucesso até que os povos aliados europeus e asiáticos cujos exércitos os combateram de 1939 a 1945!
A união européia é conduzida pela Alemanha. A Itália está integrada ao grupo tal como esteve integrada ao Eixo. O Japão se tornou na terceira maior economia do mundo, de onde foi alijada somente há poucos dias pelo crescimento da China.
Toda esta longa introdução para chegar ao capítulo das culpas dos povos pelas atitudes de seus líderes que sempre foram por eles apoiados nos sistemas vigentes em cada um de seus países.
Vamos lá às coisas mais desagradáveis de ouvir : quem identificava judeus para Gestapo eram os bons alemães, assim como os italianos patriotas faziam o mesmo com os judeus da Itália.
O laborioso povo japonês, fardado, cometeu barbaridades contra coreanos, chineses, ingleses, holandeses, e quem mais estivesse a sua frente.
Com o fim da guerra muitos deles - do povo patriota - foram levados aos tribunais e condenados pelos atos que fizeram "por terem cumprido ordens".
Mas, nem 1% da grande massa que cometeu barbaridades foi parar nos tribunais.
E, não tenho medo de errar, ao declarar aqui que ninguém se sentiu culpado de coisa alguma feita sob as ordens dos mandantes de plantão.
Como hoje novamente não se sentiriam culpadas de coisa alguma que lhes fosse ordenada pelos seus dirigentes máximos. Especialmente quando eles pela palavra ou pela tradição entusiasmavam todos a seguirem as suas ideias.
Ao cursar a faculdade de Direito uma das coisas que mais me fascinava era a determinação da culpa. E em seguida as ações da sociedade para punir os culpados cujos crimes haviam sido julgados.
Até o início do século XIX as penas para quem cometia crimes eram físicas.
Corta o nariz, marca com ferro em brasa, arranca um olho, anda com uma cangalha no pescoço e todos podem dar pancadas enquanto ele passa pelas ruas, leva 50 chibatadas.
Ou enforca, ou fuzila. Até furto de carteira era punido na Inglaterra com enforcamento em praça pública. Um acontecimento que atraia multidões, inclusive de batedores de carteira que mesmo diante do colega com a corda no pescoço cumpriam bravamente a sua missão de furtar carteiras. Atenção: não era assalto na base do "a bolsa ou a vida!" Era afanar a carteira ou a bolsa do cidadão numa mágica rápida só percebida pelo sem carteira quando ficava difícil identificar os ladrões.
Na verdade todas estas penas implicavam na morte do culpado. Mais depressa ou mais lentamente. Chibatadas com um chicote imundo, quando não havia medicamentos, matavam de infecção em poucos dias. E ninguém, nossos antepassados inclusive, via nada de tão mau nisto.
A ideia de mandar criminosos para a prisão nasceu para "recuperar os criminosos, que teriam se tornado criminosos por culpa da sociedade". E a sociedade toda por meio dos recursos gerados por seus impostos tratava de recuperar os recuperáveis.Ou seja, cada crime tinha duas penas: a prisão do criminoso e o pagamento de sua recuperação pela sociedade.
Muitos nazistas, fascistas e japoneses fiéis ao imperador passaram por prisões - quando não foram condenados à morte - e voltaram à sociedade depois de cumprirem as suas penas.
E os seus compatriotas que os apoiaram plenamente as suas ações?
E que com quase absoluta certeza fariam exatamente o que os condenados fizeram? Como exorcizaram as suas culpas? Como voltaram ao convívio com a sociedade?
Ora, basta visitar os seus países.
Estão todos, desde os muito jovens, aos adultos e aos velhos que conviveram com as barbaridades, muito bem.
Por isto tenho horror quando hoje em dia alguém argumenta alguma coisa usando adjetivos pátrios genéricos.
Ora, você sabe como os argentinos são...
Ora, nos Estados Unidos, os americanos jamais aceitariam este desrespeito às Leis...
Ora, os japoneses são admiráveis. Depois do tsunami e do terremoto as ruas estavam todas limpas, enquanto os edifícios estavam todos destruídos...
Quer piorar: você não pode confiar nesta torcida do Vasco, os corintianos não pensam, os colorados matam seus adversários por causa da cor da camisa...
Por isto fica cada vez mais claro para mim que as pessoas são exatamente aquilo em que acreditam.
E que o exercício de repensar as suas crenças e a sua fé é a atividade mais sadia a que todos podemos e devemos nos dedicar.
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